Edital da Prefeitura visa contratar serviços "em caráter suplementar ao SUS"; manifestantes rechaçam uso de dinheiro público para enfraquecer o SUS

Ato 0 09 10Ao final do protesto na Praça da Concórdia, participantes fizeram uma caminhada até a UPA Campo Grande

Um edital de quase 33 milhões de reais (R$ 32.998.661,86), lançado pela Prefeitura para contratar "serviços de assistência à saúde em caráter suplementar ao SUS" na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Campo Grande, levou moradores da região a protestarem na Praça da Concórdia neste sábado, 09/10. A manifestação, organizada pelo grupo Campo Grande em Ação, teve o apoio e participação de membros de Conselhos Locais, Distrital e Municipal de Saúde, além de organizações populares e sindicais.

Representando os/as integrantes de Conselhos Locais de Saúde, falou Luiz Carlos Felicidade, do Centro de Saúde do Jardim Santa Rosa. "Que a gente continue mobilizados, porque o SUS é nosso, ninguém tem o direito de terceirizar, de privatizar o que é nosso por direito. Porque todos nós aqui somos contribuintes, a saúde é direito de todos", defendeu Luiz Carlos. Pelo Movimento Popular de Saúde (Mops), Lúcio Rodrigues disse que o SUS é uma das principais políticas do País, que proporciona "saúde pública com dignidade" à população. Mas, segundo ele, há tempos vem enfrentando problemas em Campinas por conta da falta de trabalhadores.

"A cidade de Campinas não é de hoje que deixou de recompor os trabalhadores da Saúde para garantir a assistência que nós precisamos. São aqueles que adoecem e não têm a reposição, são as profissionais grávidas, que têm que sair para o afastamento e não têm a reposição, muitos dos colegas que acabaram perdendo a vida, como agora na Covid, não têm a reposição. E a população da nossa cidade paga o pato, porque isso vai precarizando, vai forçando os trabalhadores a trabalharem dobrado, e vai forçando a população a ficar xingando nos balcões de atendimento: 'essa merda não presta', 'essa merda não funciona'", afirmou Lúcio, que representa o Mops no Conselho Municipal.

Também participaram do ato as vereadoras e vereadores Guida Calixto, Paolla Miguel e Cecílio Santos, do PT, assim como Mariana Conti e Paulo Bufalo, do Psol. Em todos os discursos ficou ressaltada a defesa do SUS. "É tarefa de todos nós brigarmos pelo SUS, que tanto salvou vidas e que impossibilitou uma tragédia maior ainda na pandemia", disse Mariana Conti. "Há espaço no orçamento para contratação emergencial, visto que neste momento não dá para fazer concurso. Mas no orçamento - isso foi apresentado para nós na Câmara de Vereadores -, tem espaço para contratação, não o fazem porque não querem", argumentou Cecílio. Mariana e Cecílio são membros da Comissão de Política Social e Saúde da Câmara Municipal.

Problemas no edital
"Qual é o problema da UPA, que todo mundo sabe? Falta pessoal, não é isso? Sabe o que que eles colocaram nesse edital? Botar estudante para prestar serviço na UPA. Quer dizer, falta pessoal, e o edital que eles chamam é para colocar estudante. Como assim?", perguntou a presidente do Conselho Municipal de Saúde, Nayara Oliveira, em sua fala na manifestação. Além disso, para as entidades apresentarem o projeto para concorrer, "é preciso muito mais tempo do que o que foi dado", destacou Nayara, referindo-se ao número de dias (de 30/09 a 13/10) que o edital dá para os concorrentes se inscreverem, com toda a documentação exigida.

Nayara contou que o Conselho fez uma análise do edital e levou as questões para o Ministério Público. "Inclusive porque é um edital de mais de 30 milhões de reais, é um edital com um valor altíssimo, para sete dias úteis apenas para que as entidades se inscrevam. Então, há muitos indícios de direcionamento nesse edital", afirmou. Para ela, Campinas está na iminência de ter uma segunda Vitale Saúde - a Organização Social (OS) condenada por corrupção na administração do Hospital Ouro Verde: "É disso que se trata. É a corrupção sendo colocada na linha do horizonte de Campinas de novo".

Sobre a Rede Mário Gatti alegar a existência de uma lei federal que impede a realização de concursos públicos, daí a necessidade de fazer a terceirização para viabilizar a contratação de pessoal, Nayara lembrou que a autarquia foi criada em 2018 e até agora não fez concurso público. "Por quê, desde 2018, nunca fez concurso público? Sabem quantas empresas hoje existem quarteirizando e terceirizando mão de obra na Rede Mário Gatti (composta pelo Samu, as quatro UPAS e os dois hospitais)? Mais de 30 empresas contratadas pela Rede Mário Gatti, todas comendo dinheiro público e fazendo esse nível de assistência à saúde que fazem", informou.

Defesa da terceirização
Durante a manifestação, o administrador do grupo Campo Grande em Ação, Marcos J. Oliveira, um dos organizadores do ato contra a privatização da UPA, convidou o vereador Higor Diego (Republicanos) para vir falar em defesa da privatização da UPA. Higor, que estava ao lado, no posto da Guarda Municipal, não aceitou o convite, mas veio depois falar com Marcos, como se pode ver na foto abaixo.

Higor Ato 09 10Foto: grupo Campo Grande em Ação

Em pronunciamento na sessão da Câmara da última quarta-feira, 06/10, o vereador Higor apresentou argumentos para se contrapor aos vereadores contrários à terceirização. "Vai ser a primeira UPA a ser terceirizada no município de Campinas. Mas não é uma terceirização igual OS, tem que deixar claro, aquela corrupção que houve no Hospital Ouro Verde. Não, aqui o procedimento é diferente. Nós estamos tentando que seja uma unidade de ensino, por exemplo a PUC, a Unicamp, São Leopoldo. São unidades acadêmicas, para levar os estudantes para ajudarem na UPA. É isso que nós precisamos", afirmou Higor.

Sobre a realização de concurso público para a contratação de profissionais para a UPA, Higor disse que existem dificuldades "em relação aos colaboradores" e citou Dário: "o nosso prefeito, Dário Saadi, ele é médico. Antes de ele ser prefeito, ele é médico concursado. Se ele está fazendo esse projeto, é porque ele sabe que não dá certo fazer concurso. Ele tem propriedade, como pessoa e como profissional, para sugerir esse tipo de contratação. O prefeito Dário sabe a dificuldade que nós temos em relação aos colaboradores".

O que diz a Rede Mário Gatti?
Nada! O Informa Campinas solicitou informações à assessoria de imprensa da Rede Mário Gatti no dia 04/10. Mas até o fechamento desta matéria, neste dia 11/10, as respostas não tinham sido enviadas. Entre as perguntas feitas à Rede Mário Gatti, está o número de médicos que estão atualmente atendendo na UPA Campo Grande e qual é o número necessário para completar o quadro.

Outra pergunta foi sobre a perspectiva de disponibilização de profissionais, caso a contratação da entidade terceirizada aconteça no período estipulado pelo edital.

O Informa Campinas continuará enviando perguntas à Rede Mário Gatti, agora também acionando a Lei de Acesso à Informação (LAI). Quando as respostas chegarem, serão publicadas.

(Matéria atualizada em 11/10, às 10h10, para complementar informações).

Veja mais algumas fotos da manifestação:


Marcos Ato 09 10Foto: grupo Campo Grande em Ação

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Ato 11 09 10

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