Não passarão: vereador Zé Carlos, presidente da Câmara, comunica banimento de pessoas que estiveram na plateia da sessão de segunda-feira, 08/11, em que Paolla Miguel foi agredida

Paolla 10 11Paolla, durante sua fala na sessão desta quarta-feira, 10/11 - Foto: Reprodução | TV Câmara

"Essas pessoas já estão terminantemente proibidas de adentrar o Plenário da Câmara, elas não vão entrar porque elas ofenderam vários vereadores, elas não são dignas de estarem aqui [...] Nós temos o registro a partir do momento que eles entram, com documentação, imagem", disse o vereador Zé Carlos, no início da sessão desta quarta-feira, 10/11.

O comunicado do presidente da Câmara Municipal de Campinas se deu em resposta ao vereador Luiz Cirilo (PSDB), que solicitou as imagens gravadas na sessão da segunda-feira para identificar e "banir" as pessoas que, "durante toda a sessão criaram um clima hostil".

"Nós recebemos nota de solidariedade da OAB de Campinas e das 20 cidades que compõem o Parlamento da Região Metropolitana de Campinas. Todas as cidades fizeram moções de repúdio por essa infeliz pessoa - que se diz ser humana - naquele momento em que a vereadora discursava. Eu tenho todas essas moções de repúdio e vou passar depois às mãos da vereadora Paolla Miguel", informou Zé Carlos (PSB).

Apontando que o ocorrido na sessão de segunda-feira "precisa ser um ato educativo não só para a Câmara Municipal, mas para a cidade de Campinas", o professor e vereador Paulo Bufalo (Psol) defendeu que a Câmara, como uma instituição do Estado brasileiro, não pode se omitir diante do negacionismo.

"Aqui foi dito que vacina mata, aqui as pessoas tiraram a máscara, cometendo um crime nas dependências da Câmara municipal, inclusive nessa tribuna. Aqui as pessoas desrespeitaram parlamentares e aqui também as pessoas cometeram o crime de racismo", lembrou Paulo Bufalo, ao argumentar que é preciso "regular as relações nos espaços públicos, que não podem ser confundidos com espaços privados".

Quem foi
Em seu comentário sobre o que ocorreu na sessão anterior da Câmara, o vereador Jorge Schneider (PL) revelou que viu a mulher pronunciando a ofensa racista contra Paolla e que irá reconhecer a pessoa nas imagens para fazer a comprovação.

"Foi horrível eu estar sentado ali e ouvir aquela frase que fizeram para a Paolla, eu vim aqui à frente e falei ao presidente [...] 'temos que prender essa pessoa'. Eu não tenho provas, mas eu vi quem foi que falou. Eu não tenho como comprovar, precisamos ver as imagens", disse o vereador.

Schneider destacou que é a mesma pessoa que "xingou todos os vereadores também na segunda-feira" e que se trata de "uma senhora de respeito, uma senhora, de uma vida ilibada, que deve ir nos grandes clubes".

Ética na Casa
Para a vereadora Guida Calixto (PT), é preciso ir "um pouco mais além" do que apenas condenar pessoas que estavam na plateia. "Elas foram ali alimentadas, incentivadas pelo vereador, e aí é necessário falar que é o vereador Nelson Hossri [...]. E eu quero repudiar esse incentivo que esse vereador fez para essas pessoas, acobertando, incentivando, motivando essas pessoas a acharem que elas podem falar o que elas quiserem para qualquer pessoa, cometendo o crime de racismo", disse.

Como Nelson Hossri (PSD) faz parte da base de apoio do governo na Câmara, Guida questionou também o prefeito, cobrando que ele vá além do envio de solidariedade à Paolla e se pronuncie sobre os fatos: "o prefeito tem que se manifestar de forma clara, incisiva, porque, se ele não fizer isso, ele concorda com as práticas que foram realizadas na última sessão aqui nessa casa".

Nelson Hossri, por sua vez, respondeu que não podia ser responsabilizado pelo comportamento das pessoas. "Eu não sou chefe de torcida, não trouxe e não convoquei ninguém para essa Casa, se tratava de uma pauta da direita, e eles vieram de livre e espontânea vontade", disse o vereador, referindo-se à presença dos grupos para apoiar seu projeto contra a exigência de comprovante de vacina para entrada em eventos e outros locais passíveis de aglomeração.

Contando que tomou as duas doses da vacina e que é contra a injúria racial, Nelson Hossri afirmou que está abrindo processo contra os/as vereadores que o estão acusando. "Isso daí é um crime, crime de injúria, de calúnia, e pode ter a absoluta certeza de que todos vocês serão processados", protestou.

Ainda sobre a responsabilidade e responsabilização de quem tem o mandato de vereador, Gustavo Petta (PCdoB) apresentou o Art. 6º do Código de Ética Parlamentar da Câmara de Campinas, que lista os deveres do vereador, no exercício do mandato parlamentar, para a manutenção do decoro e da dignidade da Câmara Municipal. Em seguida, o vereador leu o quinto ponto desta lista, que estabelece:

"Trabalhar pela promoção do bem-estar social e pela eliminação das desigualdades sociais e de toda forma de preconceito, respeitando as diferenças de sexo, etnia, raça, idade, crença, diferenças religiosas, ideologias políticas e de identidade ou orientação sexual".

Não foi injúria
Com o uso do tempo da liderança do Partido dos Trabalhadores (PT), cedido pelo líder de bancada Cecílio Santos, a vereadora Paolla Miguel fez um longo pronunciamento, começando pelo pedido de reconhecimento da existência do racismo e da necessidade de sua erradicação. Veja alguns trechos:

"Hoje, eu quero começar a minha fala pedindo para os meus colegas vereadores e vereadoras que prestem solidariedade, mesmo que seja mentalmente, a cada mulher preta, a cada homem preto, vítima de racismo no nosso País. Peço que reflitam, como cidadãos e como formadores de leis, o que a gente já fez e o que a gente ainda pode fazer para acabar com essa praga que tem no Brasil".

"Não me julgaram por ter sido a segunda parlamentar que mais protocolou projetos nesta casa, não me avaliaram pelas leis que foram aprovadas, como o combate à violência contra a mulher, o Dia Teresa de Benguela. Sequer discutiram os projetos do pacote Marielle que eu protocolei aqui em março. Talvez não saibam, mas eu também protocolei aqui o projeto transcidadania, contra a LGBTfobia na nossa cidade".

"Talvez vocês desconheçam, mas quando a gente discutiu o orçamento e o PPA, eu fui tema de uma aula na universidade, como referência de parlamentar competente e preparada. Para eles, nada disso interessa. Não são as minhas ações que importam. Essas podem e devem ser debatidas, questionadas, criticadas".

"Me atacaram pelo que eu represento, por aquilo que eu sou. Ainda hoje os espaços institucionais da política são ocupados majoritariamente por uma elite ou por representantes dela. Mas isso está mudando, e essa reação violenta expressada por setores radicalizados, porém não restrita a eles, é sem dúvida o medo, o ódio de sermos cada vez mais sementes".

"Não foi injúria, vários outros vereadores subiram aqui e também disseram que se sentiram ofendidos por aquilo que aconteceu. Então, isso que aconteceu aqui na última sessão foi racismo, foi o ódio contra um povo e não simplesmente contra a minha pessoa. Me entristece saber que o preconceito e a discriminação ainda existe na nossa sociedade, na nossa cidade e que aconteceu isso aqui na Casa do Povo".

"Mas o que eu pude perceber com muita alegria, com muita esperança, é que muitos, não só os vereadores presentes (como o presidente desta Casa, que teve uma postura muito acertada, no mesmo momento em que percebeu aquilo que estava acontecendo), vieram me prestar solidariedade, me ligaram, me mandaram mensagens. E isso eu quero dizer que me ajudou muito a vir mais uma vez a essa tribuna para conseguir aqui falar novamente com vocês, nesse espaço para o qual eu fui democraticamente eleita, mas na última sessão eu não senti que podia ocupá-lo".

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